Na Fazenda

Uma visita à fazenda onde passou a infância leva Silvia a descobrir coisas intrigantes sobre o caseiro, sua esposa e uma prima dela.

Na Fazenda
Photo by Allef Vinicius on Unsplash

Foram várias coincidências que me fizeram escolher visitar a fazenda onde meus pais viveram, naquela semana. Eu havia programado uma semana de folga no escritório e o plano era ir com o marido para São Paulo, mas ele teve um problema muito sério no trabalho e não pode ir. Os filhos já estavam encaminhados para a casa dos primos, e não quiseram mudar isso. E a secretária do meu marido, ao cancelar as passagens dele para São Paulo, cancelou as minhas também, que estavam na mesma reserva. Com o preço nas alturas para emitir outra em cima da hora e chateada com os acontecimentos, decidi passar uma semana longe de tudo e de todos.

Meu pai comprou essa fazenda na década de 70, para criar gado leiteiro. Ali criou os filhos e conheceu os netos. Com o avanço da soja na região, meu pai arrendou quase toda a área e manteve uma porção pequena, com poucas cabeças de gado, um belo pomar, a represa e a casa onde viveu até falecer, um ano depois de minha mãe.

A casa é enorme, com vários quartos, aquela coisa de fazenda mesmo. Toda a área continua arrendada e eu e meus irmãos dividimos a renda anual. Também decidimos manter a casa e a criação de gado, como meu pai gostava. Para cuidar de tudo, contávamos com o Seu Leôncio, o vaqueiro de confiança da família praticamente desde que nasceu - seu pai foi o primeiro vaqueiro que meu pai contratou e Leôncio nasceu ali, alguns anos antes de mim, a primogênita.

Seu Leôncio viu os irmãos irem para a cidade estudar, aprendeu o ofício com seu velho pai e assumiu o seu lugar quando ele faleceu, há mais de 30 anos. Casado com Dona Betinha, eles não tiveram filhos e moram numa casinha próxima da casa principal.

O casal sempre foi um exemplo de que a vida na roça é saudável. Dona Betinha mantém o mesmo corpo de quando era jovem: baixinha, magra, cabelos lisos e negros como a noite. No corpo pequeno, os seios grandes e as pernas grossas chamam a atenção. O rosto, judiado pelo sol, mostra os efeitos do tempo, mas ainda mostra resquícios da beleza da juventude.

Seu Leôncio é um moreno alto, de corpo esguio, com músculos desenvolvidos pela lida diária e com um rosto muito marcante, sempre enfeitado pela barba por fazer. Me lembro de minhas primas suspirando quando ele passava por nós nas nossas férias da adolescência. Eu achava graça, pois não tinha nenhum sentimento por ele, talvez por tê-lo quase como um irmão mais velho. Me chamava a atenção que ele sempre tomava banho antes do almoço e caprichava no perfume. Era uma colônia suave, que contrastava com sua rudeza e tomava conta da cozinha quando ele almoçava conosco.

Dona Betinha, assim como Seu Leôncio, já passara dos 50, e eu sempre me dei muito bem com ela, que ajudava minha mãe na lida diária, ouvia todas as nossas conversas e sempre tinha um comentário muito sábio a fazer.

Não me esqueço de quando, enfrentando minha primeira crise no casamento, busquei o conforto daquela casa e os conselhos de minha mãe. Ouvindo a história da traição de meu marido, Dona Betinha disparou: