Aventura Gastronômica
Freud conhece a bela Helena, chef de um restaurante italiano, e se encanta com sua comida e com sua beleza. A admiração os leva a um encontro que culmina em um intenso jogo de poder.

Eu tenho uma relação de extremos com Belo Horizonte. A cidade me fascina com a cultura mineira, com a gastronomia dos bares e mercados e com o acolhimento do povo. E me frustra profundamente com as ladeiras intermináveis, o aeroporto distante de tudo e o trânsito intenso.
Um projeto importante no trabalho transforma a capital mineira fosse o meu escritório por pelo menos três meses. A tradição dos mineiros, de acolher, não é suficiente para superar as frustrações que meu papel causa. Minha missão é cortar despesas, demitir pessoas.
Calejado com outras experiências similares, restrinjo o meu contato com a equipe aos assuntos do projeto. Recuso os convites para os tradicionais happy hours nos botecos da Savassi. Prefiro almoçar sozinho. Esse isolamento me ajuda a tomar decisões com menos envolvimento emocional. Não é bonito, mas é necessário.
Essa é uma semana crítica para o projeto. Ontem, segunda-feira, a primeira onda de demissões foi anunciada. Por onde ando no escritório, ouço cochichos e vejo olhares desconfiados. Uma tele conferência com a equipe de São Paulo me faz perder o horário do almoço.
Já são passa das duas da tarde quando eu deixo o escritório à procura de um restaurante. Preciso organizar os pensamentos e relaxar um pouco. Meu próximo compromisso é só às cinco da tarde. Quero e mereço uma taça de vinho. Caminho um pouco mais do que o normal e chego a um cruzamento com um boteco em cada esquina. Olho ao redor e vejo um pequeno restaurante italiano.
O local está praticamente vazio. O salão não é grande. Ao fundo, um bar com um balcão. Do outro lado do bar, uma grande janela de vidro dá vista para a cozinha. A garçonete me recebe.
-Mesa para quantas pessoas?
-Uma. Estou sozinho.
-Claro. Me acompanhe.
Ela me instala em uma mesa próxima do bar e da cozinha. Me entrega o cardápio executivo. Escolho o espaguete à carbonara. Peço uma taça de vinho da casa.
-Ótima escolha. Já trago seu vinho e uma água para acompanhar. Com gás ou sem gás?
-Sem gás, por favor.
A simpatia dela me acalma. O restaurante é muito bem decorado. Itens que remetem à Itália estão por toda parte, misturados com objetos da tradição mineira. Essas duas culturas, aliás, são muito parecidas, mas isso é assunto para outro momento.
O vinho é ótimo. O prato, melhor ainda. Como sem pressa. Aproveito o momento para relaxar e pensar nos próximos passos do projeto. A garçonete volta e retira meu prato.
-Mais uma taça de vinho?
Fico tentado.
-Melhor não. Tenho uma reunião logo mais.
-Então um café?
-Sim, aceito o café.
Além do café, ela trás um pedaço de doce de leite em barra. Que delícia. Enquanto saboreio aquele momento quase mágico no meio de um dia estressante, eu a vejo pela primeira vez. A chef do restaurante.
Magra, morena, alta, esguia. Ela vem da cozinha, caminhando apressada. Passa pela porta que divide os ambientes e retira a touca. Cabelos curtos. Vai ao bar. Dá ordens. Fala rápido, firme. Rapidamente volta para a cozinha. E a visão dela indo é ainda melhor - que bunda!
Ao pagar a conta, tento obter mais informações com a garçonete.
-Adorei a comida, o vinho, o café e o doce de leite. Leve meus cumprimento ao chef.
-É a chef, Helena. Vou levar. Além de chef, ela é a dona.
Os mineiros têm esse jeito de contar além do que perguntamos. Parece que todos fazem parte da família. Aproveito.
-Ela e o marido tocam o restaurante, então?!
-Ela não tem marido. É só ela que comanda tudo por aqui.
-Vocês funcionam no jantar?
-Sim, mas precisa de reserva. São poucas mesas e o movimento está intenso.
-Pode fazer uma reserva para amanhã?
-Claro, só um minuto.
A garçonete anota minhas informações. Volto caminhando em paz para o escritório. Pena que isso não vai durar muito tempo.